sábado, 17 de maio de 2014

Rachel e Nélson Rodrigues

Na primeira etapa da fase de ouro de uma grande revista, Raquel (de Queiróz) chegava e logo numa das primeiras mesas encontrava o Nélson Rodrigues de cigarro na boca, último suspensório, a dedilhar a máquina. Era o Nélson de antes do Vestido de Noiva, o Nélson ainda não teatrólogo nem romancista. Escrevia, sob o pseudônimo de Suzanna Flag, um folhetim, Meu Destino é Pecar. Não frequentava teatros. Mas, nas matérias anônimas de redação, todo o seu talento, toda a sua força estavam latentes, pulsando, prestes a explodir. E quando Ziembinski montou aquele milagre do Vestido de Noiva, a Rachel apenas sorriu. Ela sabia, mais dia, menos dia, acabaria acontecendo. Todo aquele poder criador do Nélson não se podia eternizar no silêncio do texto sem nome.
Não me lembro se Rachel escreveu sobre a peça, ela que adora teatro. Mas, a partir daquele dia, tínhamos em nosso zoo a doce senhora do agreste e o monstro urbano, a Rachel e o Nélson, o sertão e a rua.

David Nasser - Revista Manchete - 25 de novembro de 1977.

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